O etanol pode ser a solução para a mobilidade limpa. Combustível de cana-de-açúcar polui menos do que eletricidade
O mundo vive um problema: o aquecimento da temperatura da Terra, que pode aumentar em 4º C se não forem tomadas medidas drásticas para reduzir a emissão de CO2 na atmosfera.
Esse aumento de temperatura vai implicar em um impacto direto na vida das pessoas. As previsões são dramáticas. Caso as emissões continuem no mesmo ritmo, chegaremos em poucos anos a temperatura de 43 graus centígrados na linha do equador, ou 4 graus de variação (hoje estamos com 1,5 graus de variação). Essa situação vai criar três milhões de refugiados do clima, pessoas que terão que se deslocar das regiões onde vivem por não suportar o aquecimento global, pois seria impossível viver com uma temperatura permanente (365 dias por ano) acima de 40 graus centígrados.
As populações afetadas serão as de países periféricos, ou seja, os que menos emitem: dos 50 giga de toneladas de CO2 emitidas, 11,7 são da China, 5,7 dos Estados Unidos, 3,3 da Europa e 3,3 da Índia. O Brasil é responsável pela emissão de 1,4 giga de toneladas de CO2, grande parte (35%) pelo rebanho bovino, que é o maior do mundo e muito pouco por emissões de derivados de petróleo, uma vez que 84% da fonte energética do Brasil é renovável.
Mesmo assim, o Brasil assumiu compromissos importantes na COP 27, a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima realizada em 20 de novembro de 2022 no Egito. O encontro reafirmou a limitação a 1,5 grau o aumento da temperatura terrestre.
Antes da era industrial as emissões de carbono existiam, mas as compensações naturais eram suficientes para manter o equilíbrio. Hoje a temperatura vem aumentando gradativamente. O mundo emitiu em 2021 nada menos do que 1,3 mil megatoneladas de CO2.
Embora não seja o principal, o setor de transporte é um importante ator desse processo de destruição da camada de ozônio.
Da parte da indústria automobilística, há um processo de redução das emissões que caminha para a Mobilidade Limpa, ou seja, a redução – quando não a eliminação – do uso das energias fósseis para a propulsão dos motores dos veículos, basicamente o uso do petróleo.
Países do chamado do Primeiro Mundo apostam na mobilidade elétrica para solucionar o problema. A Europa já determinou o fim do motor a combustão nos próximos dez ou quinze anos e a China constrói a maior frota de elétricos do mundo, tendência que se consolida também nos Estados Unidos e Japão.
Enquanto isso, o Brasil apenas começa a conhecer a tecnologia, ainda muito incipiente e em geral exclusiva aos segmentos de luxo, uma vez que, mesmo com a isenção do imposto importação, os carros eletrificados ainda são muito caros e o país não tem uma estrutura de abastecimento que permita aos usuários usufruírem das possibilidades que a mobilidade elétrica oferece.
A venda de carros eletrificados – elétricos e híbridos – são residuais. Em 2022, foram licenciadas apenas 8.440 unidades e a previsão para 2023 é de 70 mil, um crescimento fabuloso, mas que significa apenas 3,5% das vendas totais.
As projeções indicam que em 2030 o Brasil terá 20% de vendas de carros eletrificados (híbridos e elétricos puros), enquanto os Estados Unidos terão 50% e a Europa terá eliminado totalmente a produção de carros à combustão.
Mas para o Brasil, o carro elétrico não tem a mesma importância que tem em outros países. Isso porque temos um combustível renovável e de baixas emissões. O etanol, revelam as pesquisas, pode ser menos poluente do que a eletricidade. Um teste comparativo feito pela Stellantis comprovou que o uso do álcool no motor a combustão emite menos CO2 do que os carros elétricos que rodam na Europa, assim, essa alternativa pode fazer frente à tecnologia elétrica.
Usando etanol, o carro flex desenvolvido no Brasil emite 0,11 grama de CO2 por quilômetro rodado, menos do que o carro elétrico que roda da Europa, que emite 0,13g por km rodado.
O teste, feito em parceria com a Bosch, comparou os combustíveis mais utilizados hoje no mercado, com foco nas emissões. O resultado apontou que a melhor solução é a combinação do etanol com a eletricidade, ou seja, o carro híbrido a álcool.
Num percurso simulado de 240 quilômetros, o carro elétrico usando energia elétrica produzida na Europa, emitiu 30,41 kg de CO2, ou 0,13 gramas por km. O mesmo elétrico carregado com energia produzida no Brasil emitiu bem menos: 25,89kg de CO2 e o desempenho do etanol ficou entre os dois: emitiu 25,79kg, ou 0,11 grama por quilometro rodado. O assustador é o volume de emissão do carro à gasolina: 60,64kg, o dobro ou mais do que qualquer das demais fontes. Lembrando que a gasolina utilizada é a vendida no Brasil, ou seja, que já tem 27% de etanol na mistura.
Por que as emissões do elétrico que circula no Brasil são menores do que as do carro que roda na Europa? Porque a produção da nossa energia elétrica vem de fontes limpas, principalmente hidroelétricas, e mais recentemente eólica e solar, enquanto a Europa usa fontes sujas, como o carvão, para gerar eletricidade.
TESTE – Percurso de 240,49 km
Combustível Emissões Emissões p/km
Gasolina E7 60,64 kg de CO2 0,25g/km
Elétrico 100% Europa 30,41 kg de CO2 0,13g/km
Etanol (E100) 25,79 kg de CO2 0,11g/km
Elétrico 100% 21,45 kg de CO2 0,09g/km
“O etanol é um diferencial extraordinário em benefício do Brasil. É um biocombustível de baixo impacto ambiental porque a cana-de-açúcar absorve em seu ciclo vegetal o carbono liberado pelo etanol em sua queima no motor. A combinação de etanol com eletrificação em sistemas híbridos é uma alternativa de descarbonização acessível a faixas expressivas dos consumidores. É por esta via que vamos avançar”, disse Antonio Filosa, presidente da Stellantis para a América do Sul, lembrando que a cultura de cana-de-açúcar ocupa 1% do território nacional.
Por outro lado, o uso do carro elétrico, de emissão zero, não pode ser considerado como solução a curto prazo, segundo João Irineu Medeiros, diretor de Compliance de Produto da Stellantis, para quem a substituição da tecnologia de motor a combustão para o motor elétrico poderia significar a desindustrialização do Brasil caso fosse feita em curto prazo.
Como se vê, há quem aposte no carro híbrido a álcool como a melhor opção para a mobilidade sustentável no Brasil. Estamos vivendo um momento de busca de alternativas e de transição para uma mobilidade limpa, para ajudar a salvar o planeta do aquecimento global. Daí que todos os esforços são bem-vindos. Mas o Brasil pode, sim, fazer a diferença e servir de exemplo para o mundo com o combustível que está entre nós (entre os nós do colmo da cana).
Publicado originalmente em www.autoinforme.com.br
Por Joel Leite